História de Varginha, por José Roberto Sales

O historiador José Roberto Sales, especialista em História e Construção Social do Brasil, dedica-se há muitos anos ao resgate da história de Varginha. Sales publicou vários livros que relatam os costumes de nossos antepassados e que mostram como o município atingiu o grau de desenvolvimento dos dias atuais.

A pedido da Fundação Cultural, o pesquisador destacou alguns momentos mais relevantes para que estas informações estivessem disponíveis para consulta de leitores por meio da internet. O texto pode ser lido a seguir e está dividido em tópicos para facilitar a navegação pelo conteúdo.

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1 INTRODUÇÃO

O texto sobre a história de Varginha, apresentado a seguir, foi elaborado a partir da escolha de alguns eixos temáticos considerados essenciais, uma vez que, despertam a curiosidade das pessoas interessadas: data da fundação e local do povoamento que deu origem ao núcleo urbano, etimologia do topônimo, evolução do povoado até a emancipação político-administrativa do município, formação populacional e economia, bem como, as principais referências bibliográficas sobre essa história (inclui a documentação das fontes primárias oficiais). Além disso, são apresentados os fatos mais marcantes da história da cidade, que contribuíram para que o município se tornasse um polo regional e um dos mais importantes de Minas Gerais: a extensão da ferrovia até Varginha, no final do século XIX, a produção e comercialização do café e a chegada dos imigrantes, com a predominância dos italianos. O foco dessa breve história de Varginha é o período entre o final do século XVIII e o início do século XX.

2 TERRITÓRIO

2.1 Descobrimento do Brasil e ocupação do território

O Brasil foi descoberto por Pedro Álvares Cabral, no dia 22 de abril de 1500. Ele aportou no atual estado da Bahia com sua armada composta por dez naus maiores e pelas caravelas Nossa Senhora Anunciada, São Pedro e Santo Antônio, embarcações mais leves e ligeiras. Logo após o descobrimento, os portugueses passaram a ocupar o vasto território então denominado Pindorama – terra das palmeiras, pela população indígena. Os descobridores supunham que a nova terra fosse insular, por isso, deram a ela o nome de Ilha de Vera Cruz. A denominação cristã Santa Cruz é um resquício da tradição medieval da supremacia política da Santa Fé, em que cabia a Roma o direito de dispor das terras e dos povos. Nesse contexto de administração política marcada por determinante influência religiosa, foi assinado o Tratado de Tordesilhas, que estabeleceu como possessões de Portugal as terras que pudessem ser descobertas, localizadas antes de uma linha imaginária, demarcada a partir de 370 léguas (1770 quilômetros) a oeste das ilhas de Cabo Verde. O nome Brasil surgiu pela primeira vez em 1505, na denominação Terra Santa Cruz do Brasil. Limitados pelos acidentes geográficos e pelo clima de uma terra desconhecida, ao mesmo tempo deslumbrante e assustadora, a ocupação do território que constitui, atualmente, o Brasil, deu-se, gradativamente, do litoral para o “coração das terras” – o vasto e desconhecido interior a oeste, referido genericamente, no século XVIII, como os sertões.

Segundo a Fundação Nacional do Índio – FUNAI, em 1500, ano do descobrimento, a população indígena do Brasil, que ocupava o litoral e o interior, era estimada em cerca de três milhões de habitantes. Em 1570, menos de um século depois, essa população já havia sido reduzida à 1.200.000 habitantes, portanto, a menos de metade. Os indígenas de vários grupos étnicos falavam cerca de 1.500 idiomas, a maioria, atualmente, extinta. Esses grupos seminômades sobreviviam da caça, da pesca e da coleta de frutos, raízes e sementes e da criação de pequenos animais.

A necessidade da exploração das riquezas vegetais e minerais, demandadas pela Europa mercantilista, levou os portugueses a abrir trilhas nas matas, a atravessar rios, a escalar serras, a escravizar índios e pretos e a conquistar a terra. De espaço a espaço, ao longo das trilhas de desbravamento, construíram rústicas pousadas e abrigos para o reabastecimento, alimentação e repouso dos desbravadores e dos tropeiros com suas comitivas e montarias. Aos poucos, essas pousadas passaram a contar com uma população sedentária, voltada para a agricultura doméstica e para a criação de animais de montaria, transporte de pequenas cargas e consumo alimentar. Assim, surgiram os arraiais, pequenos núcleos urbanos que dariam origem às vilas e às cidades. Esse tipo de ocupação, na maioria das vezes caracterizado pela espontaneidade, refletiu-se no traçado urbano irregular dos arraiais fundados.

DANÇA DOS TAPUIAS. Pintura do holandês Albert Eckhout (1610-1666). O indígena brasileiro na visão de um europeu. Século XVII. Óleo sobre tela, 168 x 294 cm. Copenhagen. Museu Nacional da Dinamarca.

Os primeiros habitantes do Brasil eram os indígenas, que ocupavam as terras há milhares de anos. Quando se fala em “descoberta” do território, está-se considerando o ponto de vista do colonizador, cujo domínio da técnica e de artefatos de guerra mais eficazes, permitiram a subjugação dos povos autóctones. Os indígenas, se depararam, repentinamente, com um povo estranho, de pele branca, que chegou pelo mar em grandes embarcações, cobria o corpo com vestimentas, falava uma língua desconhecida e possuía armamentos de fogo espantosamente mortais.

2.2 Capitanias hereditárias 1532-1821 e entradas e bandeiras

A partir de 1532, as capitanias hereditárias foram a forma de administração territorial escolhida por Portugal, para efetivar a colonização e exploração do Brasil, dividido em regiões geográficas entregues a donatários (empreendedores), representantes do rei na Colônia. Toda a região do atual Sul de Minas integrava o território da Capitania de São Vicente 1, cujo primeiro donatário foi Martim Afonso de Souza.

Fonte: CINTRA, Jorge Pimentel.  Reconstruindo o mapa das capitanias hereditárias. An. mus. paul. [online]. 2013, vol.21, n.2, pp.11-45. 

A capitania de Minas Gerais foi criada quase duzentos anos depois, em 1720, com a divisão da capitania de São Paulo e Minas de Ouro, tornando-se província, em 1821 e estado, em 1889, após a Proclamação da República. A denominação Minas Gerais é uma referência às minas de ouro descobertas no local, no final do século XVII, descoberta essa que antecede a dos diamantes. As Ordenações Filipinas ou Ordenações do Reino, cuja primeira publicação data de 1603, estabeleceram como um dos Direitos Reais as rendas de “minas de ouro, prata ou qualquer outro metal”. Assim, estabeleceu-se as condições legais para a exploração dos minérios no Brasil pela Coroa Portuguesa.

A partir do final do século XVI, expedicionários e bandeiras paulistas, atraídos pela possibilidade da descoberta de ouro, prata e diamantes, haviam estado no território sul-mineiro. Entre os povos indígenas, a porção paulista da Serra da Mantiqueira era conhecida como Jaguamimbaba (onça-parda ou esconderijo das onças) e, a porção mineira, como amanti-kir (serra que chora; nuvem que rola; gotas de chuva) (NAVARRO, 2013).

No início do século XVII, as expedições retornavam com grande número de cativos indígenas e nenhuma riqueza mineral (MONTEIRO, 1994). A maior quantidade de entradas e bandeiras em solo mineiro ocorreu entre 1760 e 1780 (RESENDE, 2002), consequentemente, período de maior confronto bélico com os indígenas. Os bandeirantes, responsáveis pela expansão territorial do Brasil para além da delimitação oficial estabelecida pelo Tratado de Tordesilhas, escravizaram os índios e os embates entre eles eram sempre violentos. Os índios aldeados eram considerados súditos do rei de Portugal. Na segunda metade do século XVII, as bandeiras ocuparam as terras mineiras e expulsaram e/ou dizimaram grupos indígenas. Algumas bandeiras permaneceram na região sul-mineira por algum tempo, outras se deslocaram em direção a Mariana e Ouro Preto, dessa forma, o Sul de Minas tornou-se uma região de passagem constituída por uma verdadeira malha de caminhos para os paulistas que se deslocavam para o centro da Capitania. As capitanias hereditárias foram oficialmente extintas em 1821, um ano antes da Independência do Brasil.

2.3 A comarca do Rio das Mortes, o ouvidor-geral Cipriano José da Rocha e a expedição ao Sul de Minas, 1737

A comarca era uma antiga forma de organização judiciária portuguesa em que determinado número de vilas com seus territórios possuía a justiça administrada por um corregedor e ministros, que residiam na cabeça (sede) da comarca, considerada a cidade ou vila notável (BLUTEAU, 1789, vol. I, p. 288).

A Comarca do Rio das Mortes, com extenso território e limites imprecisos, foi criada em 1699, sendo sua primeira igreja ereta em 1703. Ela começou a funcionar em 1713. Na data de sua criação, era composta apenas pelo Termo do Arraial do Rio das Mortes (CARVALHO, 1922).

Em 1733, o português Cipriano José da Rocha (1685-1746), funcionário da Coroa Portuguesa, foi nomeado ouvidor-geral da Comarca do Rio das Mortes na Capitania de Minas Gerais, cuja cabeça era na Vila de São João del-Rei, antigo Arraial Novo do Rio das Mortes. O ouvidor-geral, também chamado de corregedor ou magistrado de comarca, era a autoridade máxima da Justiça, o juiz posto pelos donatários em suas terras.

Em 23 de setembro de 1737, por determinação de Martinho de Mendonça de Pina e de Proença, governador regente interino da Capitania, Cipriano partiu de São João del-Rei em expedição para o Sul de Minas, acompanhado por uma tropa composta por um meirinho (oficial de justiça com poder de citar, penhorar, prender e executar outros mandados judiciais), soldados e mineradores, com a missão de realizar uma vistoria nas terras e inventariar sua riqueza aurífera. Cipriano se refere a essa expedição como descobrimento, mas, na verdade, tratou-se de um reconhecimento oficial da existência das minas com o propósito de evitar a mineração clandestina. As cartas escritas por ele, datadas de 04 de outubro e de 09 de dezembro de 1737, endereçadas ao governador, são relatórios dessas vistorias. Nelas, Cipriano relata ter chegado às Minas do Rio Verde (Minas do Sul) no dia 02 de outubro de 1737. A carta de 04 de outubro foi redigida no Sul de Minas, no local a que Cipriano, inicialmente, denominou Campo Maior e, a de 09 de dezembro, em São João del-Rei, onde ele residia. Portanto, a expedição de Cipriano ao Sul de Minas, onde ele fundou o arraial de São Cipriano, atual cidade de Campanha, é um dos marcos oficiais mais relevantes da entrada e da ocupação da região. A partir dessa data, há uma expansão acentuada da ocupação do solo sul-mineiro. Nessa época, a economia da Colônia, no final do ciclo da cana-de-açúcar, estava relacionada a um modo de produção coletor, extrativista e agrário e à escravatura.

2.4 Início do povoamento de Varginha e emancipação político-administrativa

De modo geral, os leigos confundem a data histórica da emancipação político-administrativa da cidade com a do início do povoamento da região que futuramente teria seu topônimo denominado Espírito Santo da Varginha. O povoado de Varginha começou a ser formado no final do período das capitanias hereditárias. De povoado a município e cidade, houve um longo percurso histórico apresentado a seguir:

Em 12 de novembro de 1806, o coronel Francisco Alves da Silva e sua mulher D. Teresa Clara Rosa da Silva (1788-1840) assinaram a escritura, vendendo por quatrocentos mil-réis o terreno exigido para a constituição do patrimônio, com o objetivo de elevar o povoado à categoria de Curato. Nesse documento, Varginha é chamada apenas de Espírito Santo (não consta Catanduvas nem Varginha) (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo, Livro do Tombo (não numerado) folha 3 verso, e 4 frente e verso, 27 nov. 1906, cópia a mando do vigário Pedro Nolasco de Assis). A seguir, a transcrição com atualização ortográfica dessa escritura, marco inaugural na história da cidade, segundo a cópia feita em 1906:

~ Cópia da escritura do patrimônio da Matriz da cidade do Espírito Santo da Varginha~

O Capitão Francisco Alves da Silva e sua mulher Theresa Clara da Silva, que são senhores e possuidores de um sítio na paragem denominada “Córrego do Pinheiro”, vertente do ribeirão de “Sant’Ana”, Freguesia de Lavras do Funil, cujo sítio se compõe de uma morada de casas cobertas de telhas e matas virgens, capoeiras e campos, que se dividem da barra do Pontal pelo cume do espigão, correndo, do poente com terras de Antonio Joaquim da Silva, em parte do mesmo espigão com terras de Anna Pedrosa da Silva, e cortando pelo mesmo espigão – pelo rumo deste com terras dos mesmos vendedores até o alto do valo, tudo verte do córrego dos Pinheiros, e correndo pelo mesmo córrego, até a tapera de Gregório Manso Guisado; com terras de Manoel da Silveira Gulart [sic] e da referida tapera rumo direto a um pau nativo de massaranduba [sic] que se acha ao pé do espigão, e d’aí correndo rumo direito pelo mesmo espigão até o ribeirão de Sant’Ana; e por este ribeirão até a barra do Pontal partem com terras dos mesmos vendedores e de Manoel da Silveira Gularth [sic]; e de cujo sítio muito por nossas livres vontades, sem constrangimento de pessoa alguma fazemos venda e com efeito vendido temos de hoje para todo sempre do Alferes Manoel Francisco de Oliveira como procurador dos povos aplicados pelo preço e quantia de quatrocentos mil-réis, em que foram avaliados por dous [sic] avaliadores – o alferes Francisco Alves Pereira e Alferes Joaquim Alves Ferreira, nomeados – um pelo vendedor e outro pelo procurador dos povos, de cujos quatrocentos mil-réis estamos pagos e satisfeitos, e nos obrigamos a fazer-lhe esta venda boa, mansa e de paz, firme e valiosa por nós e nossos herdeiros e sucessores, como também a passar-lhe escritura pública, e como seu que fica sendo o dito sítio transferimos toda a posse, jus e domínio que nele tínhamos e por assim ser verdade pedimos e rogamos a João d’Ávila Ferreira, digo, d’Ávila Freire que este por nós fizesse e como testemunha se assinasse o vendedor Capitão Francisco Alves da Silva e a rogo de sua mulher Joaquina Ignácia da Silva, com as mais testemunhas presentes o Alferes Joaquim Alves Ferreira e o alferes Francisco Alves Ferreira [sic] [Pereira]. Hoje, Espírito Santo, 12 (doze) de Novembro de mil oitocentos e seis (1806) Francisco Flores da Silva assina a rogo da vendedora Thereza Clara da Silva, Joaquim Ignácio da Silva [sic] como testemunha que este vi fazer e assinarem, Francisco Alves da Silva como testemunha que este vi fazer e assinarem, Joaquim Alves Ferreira como testemunha que faz e vi assinarem João d’Ávila Ferreira [sic] [Freire]. É o que continha na referida cópia da “Escritura do Patrimônio da Matriz do Espírito Santo da Varginha”, que bem e fielmente transcrevi, digo, mandei para aqui a transcrever e assino.
Varginha, 27 de Novembro de 1906.
Vigário Pedro Nolasco de Assis [Notas: o texto da escritura possui uma redação confusa. A transcrição apresentada acima respeitou as maiúsculas, pontuação, grifos e erros do original. O redator do documento original, de 1806, ou o transcritor, de 1906, cometeram erros ou inconsistências na citação de nomes: Gulart / Gularth; Francisco Flores da Silva [Francisco Alves da Silva]; Joaquina Ignácia da Silva / Joaquim Ignácio da Silva; João d’Ávila Ferreira / João d’Ávila Freire. Essas características, aliadas ao estilo de redação do início do século XIX, período em que o documento original foi escrito, tornam ainda mais difícil a compreensão do texto]

Segundo o Monsenhor Domingos Prado Fonseca (comunicação pessoal, 2009), os “povos aplicados”, expressão utilizada na escritura, são os povos aplicados a uma religião, devotos, ou seja, no caso específico, a referência seria o catolicismo da população local. Da cópia dessa escritura, feita em 1906, o nome dela consta Teresa Clara da Silva, no entanto, no inventário de sua morte, o nome é citado como Tereza Clara Rosa da Silva (CAMPANHA – MG. Centro de Memória Cultural do Sul de Minas).

Em 03 de dezembro do mesmo ano, foi realizado o despacho da petição, na cidade de Mariana, pelo doutor Quintiliano Alves Teixeira Jardim, provisor, vigário-geral e juiz das Habilitações e Dispensas (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12). Provisor era o magistrado eclesiástico em quem os bispos delegavam a sua jurisdição contenciosa (BLUTEAU, 1789, vol. II, p. 261).

Em 04 de dezembro, foi emitida a ordem para a publicação do edital da doação patrimonial, que deveria ser afixado durante oito dias na porta da Igreja, em dia festivo, durante a estação da missa conventual (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12). A missa conventual é celebrada aos domingos e dias santos.

Em 12 de dezembro, foi cumprido o despacho do juiz das Habilitações e Dispensas, Quintiliano Alves Teixeira Jardim, pelo escrivão Antônio João Fernandes, às margens do córrego dos Pinheiros, dando posse judicial das terras ao procurador dos Povos Aplicados das Catandubas, o alferes Manoel Francisco de Oliveira (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12).

Em 18 de janeiro de 1807, foi criado o Curato do Espírito Santo das Catandubas pelo vigário de Santana de Lavras do Funil, padre José da Costa (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 13). De acordo com Lefort (1950), o nome completo do padre é José da Costa Oliveira.

MAPA DO BRASIL EM 1821. Cartografia de Alphonse de Beauchamp, Pedro Cyriaco e Pedro Figueiredo. A parte oeste do atual estado de Minas Gerais fazia fronteira com os estados do Maranhão, Pará e Piauí. Em 1821, Varginha era um povoado recém-reconhecido pela Igreja. Foto: Biblioteca Nacional Digital de Portugal.

Em primeiro de junho de 1850, a Lei Provincial n.º 471, elevou o Curato do Espírito Santo da Varginha à categoria de paróquia (freguesia), anexada ao município de Três Pontas. Com isso, a Igreja do Divino Espírito Santo foi elevada à categoria de Matriz (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro do Tombo IV, fl. 74f.), durante o paroquiato do padre Manoel Furtado de Souza.

Em 22 de setembro de 1881, a Lei Provincial nº 2785 criou e incorporou o município do Espírito Santo da Varginha à comarca de Três Pontas e elevou a freguesia à categoria de vila: a Vila do Espírito Santo da Varginha. Em 17 de dezembro, ocorreu a sessão de instalação do município e, no dia 29, a criação do foro civil.

Em 07 de outubro de 1882, a Lei Provincial nº 2950 elevou a Vila do Espírito Santo da Varginha aos foros de cidade: a cidade do Espírito Santo da Varginha. Esse dia é também o dia de Nossa Senhora do Rosário, cuja primeira capela em Varginha foi construída pela devoção e com a mão de obra dos negros escravos. Em 17 de dezembro, foi realizada a primeira reunião da Câmara Municipal, presidida pelo vereador José Maximiano Baptista, na qual foi eleito o primeiro vice-presidente (função atual de vice-prefeito). José Maximiano Baptista redigiu a ata desta reunião sendo, portanto, o primeiro redator de atas da Câmara Municipal de Varginha. Matheus Tavares da Silva, com 43 anos de idade, foi eleito Presidente da Câmara com quatro votos (atual função de prefeito) (Livro de atas da Câmara Municipal de Varginha. Museu Municipal de Varginha, 1882).

MAJOR MATHEUS TAVARES DA SILVA
(1841-1906)
1º Presidente da Câmara Municipal de Varginha
Mandato: 17/12/1882 a 14/01/1884

A data da emancipação político-administrativa de Varginha, portanto, é 07 de outubro de 1882, por isso, 07 de outubro é o Dia da Cidade. O início do povoamento e a emancipação política são eventos históricos seminais bastantes distintos entre si, separados por um intervalo temporal de pelo menos um século.

Em 1892, foi instalada a comarca de Varginha.

Nos anos que se seguiram ao descobrimento do Brasil, a região onde hoje se localiza Varginha era ocupada pela população autóctone dos índios Cataguás ou Cataguases, que, principalmente durante o século XVIII foram em parte expulsos, mortos ou assimilados pelos colonizadores portugueses. O território mineiro foi predominantemente ocupado por essa tribo indígena, o que levou à denominação de Campos Gerais dos Cataguases, adotada antes da criação da Capitania de Minas Gerais.

O início do povoamento de Varginha ocorreu no final do Brasil Colônia, quando o ciclo do açúcar estava em decadência e tinha início o ciclo do ouro. A data é imprecisa, na segunda metade do século XVIII, a partir de 1763, segundo alguns autores, principalmente Lefort (1950) e Sales (2003; 2007; 2009), ou de 1785, segundo outros (RUBIÃO, 1919; ÁVILA, 1983). O IBGE (1959; 1985) em seu site oficial endossa o ano de 1785 ao reproduzir as informações de Rubião.

A diferença entre as datas hipotéticas não é significativa; ambas situam o início do povoamento no mesmo período histórico: a segunda metade do século XVIII. Esse evento espontâneo foi condicionado por variáveis socioeconômicas, e também da ordem do desejo e da vontade das pessoas e das famílias que aqui se estabeleceram. Em 1919 (p. 3), Rubião nos alertava: “As primeiras etapas da criação e desenvolvimento desta cidade, permanecem, por falta de testemunho escrito, envoltas nas brumas da tradição trazida pelos descendentes dos primeiros povoadores destes sertões”.

Assim sendo, a escassez de fontes documentais nos impede o conhecimento da natureza íntima dessas variáveis; podemos vislumbrá-la apenas em parte por inferências, a partir dos poucos vestígios encontrados aqui e ali, principalmente na documentação produzida pela Igreja Católica em seus registros de nascimentos, óbitos, casamentos e de bens materiais em livros de tombos. Essa documentação pertence, atualmente, ao acervo histórico e eclesiástico da Paróquia do Divino Espírito Santo, em Varginha, da Cúria Diocesana da Campanha, na cidade de Campanha, e da Arquidiocese de Mariana, em Mariana. Documentos de importância histórica para Varginha como Cartas de Sesmarias, censos populacionais do século XIX e eleições provinciais podem ser pesquisados no Arquivo Público Mineiro no acervo referente à Assembleia Provincial e ao Congresso Mineiro.

A verdade é que o fato inaugurador – o início do povoamento de Varginha não está suficientemente documentado a ponto de permitir estudos conclusivos sobre uma data precisa. Ainda sobre o povoamento inicial de Varginha e sua relação com outros povoados da região vizinha, mais prósperos sob o aspecto da urbanização, economia e política, como Três Pontas, município ao qual a freguesia da Varginha encontrava-se adstrita, em 1866, o governo provincial autorizou estudos de engenharia para a verificação da melhor direção para a passagem de uma estrada de terra entre a cidade de Três Pontas e a Freguesia do Espírito Santo da Varginha (DIÁRIO DE MINAS, ed. nº. 134, p.1, 1º dez. 1866; ed. nº. 153, p. 1, 29 dez. 1866). A construção da estrada facilitaria imensamente o intercâmbio entre as duas povoações, pois antes dessa data o caminho aberto pelo uso dos tropeiros era apenas uma trilha marcada por entre as matas e as propriedades rurais. Esse fato mostra que, pelo menos até o final da primeira metade do século XIX, a região de Varginha era quase um sertão. Ainda no início do século XX, Mário de Andrade se referia ao Sul de Minas como região sertaneja. Em 1874, Bernardo Saturnino da Veiga reconhecia: “Relativamente à primitiva edificação do povoado e a seus primeiros habitantes, nada pudemos colher. Está a Varginha a este respeito em circunstâncias idênticas às de outros muitos lugares desta parte da província, onde notícias a respeito daquele interessante objeto nos foi impossível obter, não obstante o esforço que para consegui-las empregamos”. Quando o autor afirma “não obstante o esforço que para consegui-las empregamos” isso significa que, embora tenha pesquisado bastante, não conseguiu obter as informações desejadas, ou seja, ele não teve acesso às fontes documentais por não existirem ou por não terem sido localizadas. Quanto mais distante ficamos no tempo daquela época e na ausência da descoberta de novas fontes documentais, mais difícil fica a obtenção de dados e informações sobre o início do povoamento. Se Veiga reconhecia essa dificuldade no final do século XIX, constatamos que ela permanece, e agora, no início do século XXI, nos parece exponencialmente ampliada.

A emancipação político-administrativa da cidade, ao contrário, é um fato oficial legislativo extensamente documentado, ocorrido durante o Segundo Reinado sob o comando do imperador D. Pedro II, na última década do Império. Trata-se de ato burocrático do Governo Provincial, determinado por força da Lei nº. 2950, de 07 de outubro de 1882, assinada por Teófilo Ottoni, Presidente da Província, na Secretaria do Governo Provincial. A lei que eleva à Cidade a Vila do Espírito Santo da Varginha teve necessariamente desdobramentos políticos, jurídicos e administrativos imediatos, irreversíveis e definidores da forma com que a cidade, a partir de então, passou a construir sua própria história e sua identidade singular.

LIBERAL MINEIRO. Ed. n. 173, p. 1. Ouro Preto, 16 dez. 1882.

Confira a galeria de ex-prefeitos de Varginha.

2.5 Esquema cronológico-evolutivo: de povoado a cidade (séculos XVIII e XIX)

A história de Varginha tem início na segunda metade do século XVIII, quando os governadores-gerais do Estado do Brasil eram chamados de vice-reis. Varginha foi elevada à categoria de paróquia (freguesia), vila, município e cidade durante a vigência do II Reinado, período que vai de 1831 a 1889. A elevação à sede de comarca ocorreu em 1890, quando o Brasil já era República, proclamada no ano anterior, sob a presidência do marechal Manuel Deodoro da Fonseca.

O esquema cronológico-evolutivo apresentado a seguir ajuda-nos a compreender as etapas jurídico-administrativas da evolução de Varginha de povoado à elevação à categoria de Cidade:

– Povoado (1763?-1785?- 1807)
– Curato (1807-1850)
– Paróquia / freguesia (1850-1881)
– Vila (1881-1882)
– Município (1881)
– Cidade (1882)
(SALES, 2003, p. 198).

Toda essa evolução ocorreu entre o período final da Colônia com suas capitanias hereditárias e os últimos anos do Império. Evidentemente, o início do povoamento da região que viria a ser o futuro município e a cidade de Varginha, marca um rompimento brusco e, muitas vezes, trágico, com a civilização indígena autóctone local, subjugada, escravizada, aculturada e dizimada pelos colonizadores. A economia do período era agrária e mineradora, baseada na escravização do negro, mão de obra que girava toda a engrenagem da produção ao consumo, tanto local quanto para a exportação para a Europa.

2.6 O território do município de Varginha: 1882 (aproximado) e atual

A freguesia do Espírito Santo da Varginha permaneceu como um dos povoados que pertenciam ao município de Três Pontas até o ano de sua emancipação político-administrativa em 1881 / 1882. A Lei Provincial nº 2785, de 22 de setembro de 1881, criou o município de Varginha desmembrado do município de Três Pontas e a freguesia de Carmo da Cachoeira, desmembrada do município de Lavras, para passar a pertencer como distrito ao município de Varginha. Assim, o município de Varginha foi formado com terras que pertenciam, principalmente, aos municípios de Lavras e de Três Pontas (Lei nº 2785, de 22 set. 1881). No Brasil, os municípios foram e têm sido criados por desmembramento.

TERRITÓRIO DO MUNICÍPIO DE VARGINHA EM 1882 (APROXIMADO) E ATUAL. Arte: Fundação Cultural do Município de Varginha / Agnaldo Montesso, 2020. Em 1882, ano da emancipação político-administrativa de Varginha, o território do município de Varginha é representado por toda a área colorida, correspondente aos atuais municípios de Varginha, Carmo da Cachoeira, Elói Mendes e São Bento Abade. Em azul, o território do atual município de Varginha. O atual município de São Bento Abade era o antigo povoado de São Bento do Campo Belo, no então distrito de Carmo da Cachoeira, sendo, por isso, localizado no território de Varginha ao qual era jurisdicionado. Quando o distrito de Carmo da Cachoeira foi emancipado, desmembrou-se do município de Varginha e incorporou também parte do território do distrito de Luminárias, pertencente ao município de Lavras. O distrito de Carmo da Cachoeira perdeu parte do território para o novo distrito de São Bento, do município de Carmo da Cachoeira, sendo o distrito de São Bento criado também com território desmembrado do distrito de Luminárias (Decreto-Lei nº 148, de 17/12/1938). O atual município de Cordislândia era o antigo povoado de Paredes, denominado Paredes do Sapucaí, adstrito ao município de São Gonçalo do Sapucaí, pela Lei Estadual nº 556, de 30 de agosto de 1911.
2.7 Aforamento e propriedade das terras: Igreja Católica (Diocese da Campanha) x Câmara Municipal 1806-1922

Em 12 de novembro de 1806, as terras que constituem a atual região central do núcleo urbano da cidade de Varginha foram vendidas pelo coronel Francisco Alves da Silva e sua mulher, D. Teresa Clara Rosa da Silva, à população do povoado do Espírito Santo, pelo valor de Rs 400$000 (quatrocentos mil-réis). Em seguida, foram doadas à Diocese de Mariana, durante a vigência do sistema do padroado, para a constituição do patrimônio da Igreja Matriz. Nesse documento, que inaugura oficialmente a história de Varginha, o povoado é citado apenas como Espírito Santo (não foram utilizadas as denominações Catanduvas / Catandubas e Varginha). O objetivo da população era que a Igreja, por meio do recebimento da doação, reconhecesse o povoado como um curato, ou seja, que designasse um cura (pároco), para residir no local e cuidar dos ofícios religiosos.

Em 1905, o padre José Maria Mendes, vigário da paróquia do Divino Espírito Santo, fez a seguinte afirmativa sobre o patrimônio da Igreja Matriz:

A matriz d’esta cidade tem patrimônio, o qual consiste nos terrenos onde os habitantes da sede paroquial edificaram suas casas e n’outros terrenos adjacentes ainda devolutos. A extensão do patrimônio é pouco maior do que a da cidade atualmente, podendo calcular-se em 2 quilômetros de comprimento por 1 de largura, pouco mais ou menos. Existem documentos na câmara municipal, e tanto esta como o povo reconhecem à Matriz legitimo direito de posse. Os aforamentos são cobrados juntamente com outros impostos civis pela câmara municipal em virtude d’um contrato passado em tempo entre ela e o Exmo. Bispo de Marianna (MENDES, 1905).

O documento foi redigido dois anos antes da criação da Diocese da Campanha, à qual as paróquias de Varginha viriam a ser adstritas. Terrenos devolutos são terrenos desocupados ou restituídos ao primeiro proprietário. A vigência do aforamento não impedia, contudo, a compra e a venda de bens imóveis pertencentes ao patrimônio da Igreja, conforme se observa na escritura de venda de um terreno, em 1911:

Zeferino Augusto da Silva como procurador de José Seraphim de Oliveira e sua mulher D. Felícia Camélia da Costa, vende a D. Gabriela Raymunda a posse de terreno foreiro ao patrimônio da igreja desta cidade, contendo 18 metros de frente por fundos respectivos, pelo preço e quantia certa de quarenta e cinco mil-réis (Varginha, 1911. Documento do acervo do Museu Municipal de Varginha).

Após a Proclamação da República, o Decreto nº 119-A, de 07 de janeiro de 1890, proibiu a intervenção da autoridade federal e dos estados federados em matéria de conteúdo religioso, consagrou a plena liberdade dos cultos e extinguiu o padroado. A partir dessa data, várias dioceses foram criadas no Brasil, inclusive a da Campanha, a qual as paróquias de Varginha encontram-se adstritas desde então.

A progressiva ocupação do solo por aforamento e a expansão urbana do povoado, ao longo do século XIX e do início do século XX, e as terras herdadas, levantavam dúvidas e criavam insegurança jurídica em relação à identidade dos legítimos proprietários dos terrenos ocupados: seriam patrimônio da Igreja Matriz do Divino Espírito Santo? Da Diocese de Mariana e, a partir de 1907, da Diocese da Campanha? Das pessoas que nelas residiam ou cultivavam?

Essa dúvida persistiu por mais de um século, entre 1806 e 1922. Somente em 04 de novembro de 1922, a Diocese da Campanha vendeu à Câmara Municipal de Varginha os terrenos da região central da cidade de Varginha (48 alqueires), do então distrito de Carmo da Cachoeira (10 alqueires) e do povoado de São Bento do Campo Belo, atual município de São Bento Abade (10 alqueires), pelo valor de Rs 33.500$000 (trinta e três contos e quinhentos mil-réis).

Na Escritura de Transmissão de Propriedade, a Fábrica Geral dos Patrimônios da Diocese da Campanha foi a outorgante transmitente, representada por Pedro Eugênio Cleto, Fabriqueiro-Geral, e a Câmara Municipal de Varginha, a adquirente, representada por José Augusto de Paiva, presidente (cargo atual de prefeito). O documento integra o acervo do Serviço Notarial Privativo “Braga” do 1º Ofício de Varginha.
As escrituras da compra e venda dos terrenos da região central de Varginha, de 1806 e 1922, são documentos imprescindíveis para a compreensão da história local.

A publicação do Decreto nº 119-A, de 1890, a interdição do cemitério paroquial e a inauguração do cemitério municipal, administrado pela prefeitura, em 1918, e a aquisição, pela Câmara Municipal, em 1922, dos terrenos sujeitos ao regime jurídico do aforamento, são fatos sociais de marcante simbolismo, pois representam o rompimento definitivo com um tipo de ordenamento social, jurídico e religioso característico dos séculos XVIII e XIX. Dessa forma, 1922, ano da Semana de Arte Moderna, pode ser considerado o ano em que Varginha ingressou no século XX.

2.8 Topônimo: de Catanduvas a Varginha

Em relação ao topônimo, conforme constam da escritura de compra e venda do patrimônio original das terras de Varginha, de jornais da província de Minas Gerais e de documentos oficiais eclesiásticos da província de Minas Gerais e do Império do Brasil, temos as seguintes citações:

Divino Espírito Santo das Catanduvas: Certidão de Nascimento, de 1795, segundo Lefort, 1950;
Divino Espírito Santo da Varginha: Tratado de Geografia Descritiva Especial da Província de Minas Gerais, 1886;
Espírito Santo da Varginha: Decreto Imperial de 14 de julho de 1832, assinado por Diogo Feijó; Guia Postal do Império do Brazil, 1880 (p. 43); Decreto Provincial nº 8117, de 21 maio 1881; Lei Provincial nº 2785, de 22 set. 1881.
O Guia Postal do Império do Brazil, 1880, cita duas denominações: Divino Espírito Santo da Varginha (p. 40) e Espírito Santo da Varginha (p. 43).
Espírito Santo: na escritura, de 1806, em que o capitão Francisco Alves da Silva e sua mulher Teresa Clara Rosa da Silva vendem as terras da futura região de Varginha aos povos aplicados, o local é citado apenas como Espírito Santo, denominação com que também figura na Decisão Imperial nº 74, do Ministério da Fazenda, de 1883.
Varginha: substantivo simples, essa denominação simplificada consta da Lei Provincial nº 22, de 19 de março de 1841, que cita Varginha como distrito da recém-criada vila de Três Pontas. Foi essa a denominação que prevaleceu com a passagem do tempo. A documentação consultada revela que as formas simplificada e composta do topônimo foram usadas simultaneamente, desde o início, ao longo da história municipal.

A lei do menor esforço linguístico explica a tendência dos falantes a simplificarem a emissão dos sons com o propósito de dinamizar e de facilitar a comunicação, tornando-a mais rápida e eficiente. A tendência da população ao se referir aos topônimos é de simplificá-los para a menor forma possível, evidentemente, sem prejuízo da identificação: de um substantivo composto para um simples. Assim, Nossa Senhora do Carmo da Cachoeira, antigo distrito de Varginha, tornou-se Carmo da Cachoeira, sendo muitas vezes citado nos livros de atas da Câmara Municipal de Varginha, do início do século XX, apenas como Cachoeira. Outros exemplos de municípios vizinhos: Santana das Lavras do Funil tornou-se Lavras, Campanha da Princesa da Beira, Campanha.

Documentos antigos citam alternadamente ‘Catanduba’ ou ‘Catanduva’. De acordo com o Dicionário AURÉLIO (1988), o vocábulo “catanduva” ou “catanduba”, é um brasileirismo, substantivo feminino e figura no dicionário como: “Mato rasteiro, áspero e espinhento, que nasce em terreno impróprio para a agricultura”.

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), apresenta os seguintes significados e etimologia para a palavra catanduva: ingresso no idioma português em 1899, segundo consta no Novo Diccionário da Língua Portuguesa, de Cândido de Figueiredo, editado em Lisboa, no ano citado. A origem da palavra seria o tupi: kaatang’tïwa, mato rasteiro e espinhoso que nasce em terreno impróprio para cultura. A forma histórica é catanduva (1899) ou caatanduva (1902).

Entretanto, de acordo com Fonseca & Liberal (1920) e Lefort (1950), a palavra ‘catandubas’ ou ‘catanduvas’ já era utilizada em data bem anterior à estabelecida pelo Dicionário Houaiss. Fonseca & Liberal citam o documento enviado ao bispo da antiga diocese de Mariana, datado de 12 de novembro de 1806 que diz: “…como procurador dos aplicados da Capela do Divino Espírito Santo do lugar chamado as Catandubas…”. Lefort cita o documento que ele considerava o mais antigo na época da publicação da “Monografia…”: um registro de batizado, datado de 3 de abril de 1795, que fala da “capela do Divino Espírito das Catanduvas”, fazendo referência ao povoado de Varginha.

O coletivo de catanduva é catanduval. O catanduval é “extenso aglomerado de catanduvas em determinada área”. A etimologia de catanduval é catanduva + -al. No Rio Grande do Sul, catanduval é sinônimo de pinhal. Pinhal é um “extenso aglomerado de pinheiros em determinada área” (HOUAISS, 2001).

Muitos estudos, inclusive os do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, afirmam que o mato rasteiro, áspero e espinhento era o tipo de vegetação encontrado na época em que os desbravadores das Entradas e Bandeiras aqui chegaram. No entanto, as terras sul-mineiras são, de modo geral, impróprias para a agricultura? Esta questão foi abordada no romance histórico-ficcional sobre Varginha “A Memória dos Sentidos” (SALES, 2002; 2019):

“(…) Alguns botânicos acreditam que o matagal rijo e áspero, referido pelos antigos, seria formado por árvores em crescimento da araucaria angustifolia – o pinheiro-do-paraná, cujas folhas são lanceoladas, duras e pontudas. A primitiva denominação Córrego dos Pinheiros reforça esta hipótese, sugerindo a abundância desse tipo de vegetal. Portanto, estariam equivocados os estudos que se referem ao mato rasteiro, típico de terras improdutivas, pois a região sul-mineira possui solos de alta fertilidade, propícios à agricultura”.

O jesuíta João Antônio Andreoni afirma, em carta, referindo-se às árvores encontradas após a travessia da Mantiqueira: “(…) daí se descobrem muitas e aprazíveis árvores de pinhões, que a seu tempo dão abundância deles para o sustento dos mineiros […] Logo, passando outro ribeiro, (…) se vai aos Pinheirinhos, lugar assim chamado por ser o princípio deles (…) Dos Pinheirinhos se vai à estalagem do Rio Verde”. Estaria o autor se referindo à região de Varginha?

Embora não seja possível estabelecer com exatidão o local a que se refere o padre jesuíta, autor da carta, o texto é suficiente para revelar a abundância dos pinheiros em toda a região sul-mineira.

O militar português Raimundo José da Cunha Matos (1776-1839), em suas andanças pelos sertões do Brasil no período1823-1826, faz a seguinte observação sobre um local nas proximidades de Barbacena (2004, p. 22): “A última árvore da mata, que fica no lado direito da estrada, é um pinheiro; e desta qualidade tenho visto um grande número”.

O naturalista Manuel Pio Corrêa (1874-1934), endossa as informações de Andreoni ao afirmar que as sementes da araucaria (pinhões), eram utilizadas antes mesmo do Descobrimento como “um dos principais alimentos dos aborígenes do Sul, que tinham diversos processos de as preparar e conservar por largo tempo”. Segundo ele, a araucaria angustifolia “outrora formava intermináveis bosques que se estendiam desde a Serra da Bocaína até as fronteiras do Rio Grande do Sul e Paraguai” e que “É espontânea nos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, não sendo desprezível a hipótese de que sua principal zona de dispersão situa-se no Estado de Minas Gerais, de onde partiu para o Sul levada pela bacia dos rios Grande e Paraná” (grifo nosso).

Araucaria angustifolia (Pinheiro do Paraná). (Bertol. Kuntze). Árvore formada e detalhe das folhas ásperas e espinhentas, que teriam dado origem ao vocábulo Catanduva (mato rasteiro e espinhento, que, segundo Pio Correa, seriam plantações ainda jovens de araucárias e não ervas daninhas como se pensou a princípio).

No Rio Grande do Sul, catanduval (coletivo de catanduva), é sinônimo de pinhal. Segundo o Dicionário HOUAISS, o pinhal é “extenso aglomerado de pinheiros em determinada área”. Ora, o que faz essa sinonímia do uso popular senão reforçar a hipótese de Pio Corrêa? Portanto, nem todo mato rasteiro, áspero e espinhento referido pelos antigos, deveria ser aquele característico de terras improdutivas, impróprias para a agricultura.

2.9 Gentílico e epônimo: varginense, varginhense e Princesa do Sul

Para os naturais ou residentes de Varginha, o gentílico ou gentilício é varginhense. Segundo o Dicionário Houaiss, a palavra entrou no idioma português no ano de 1850. Foi neste ano que o Curato do Espírito Santo foi elevado à categoria de Freguesia.

No período imediatamente anterior e logo após a elevação de Varginha à categoria de cidade, parece ter havido por parte de algumas pessoas, principalmente políticos, jornalistas e articulistas, uma dúvida inicial em relação ao gentílico a ser utilizado para se referir aos naturais ou habitantes de Varginha.

O deputado provincial Américo de Mattos usou o gentílico dessa forma: “os Varginenses já tem feito sacrifícios bem consideráveis” (A ACTUALIDADE, ed. nº. 113, 23 out. 1880, p. 3).

No artigo, “Instalação da Vila do Espírito Santo da Varginha” o gentílico varginhense / varginenses foi utilizado por três vezes pelo autor; ele mesmo assina o artigo como “um varginense” (LIBERAL MINEIRO. Edição nº 2, p. 4. Ouro Preto, 05 jan. 1883).

A descrição dos festejos a Joaquim Eloy Mendes, por ter sido agraciado com o título nobiliárquico de Barão da Varginha, se refere à “sociedade varginense” (A UNIÃO – Órgão do Partido Conservador. Edição nº 191, p. 1, 25 jul. 1888).

Joaquim Eloy Mendes – o Barão de Varginha

Nesses casos, provavelmente, não se trata de um erro de ortografia ou de impressão, mas da novidade representada, à época, pela elevação da Vila à categoria de Cidade. É de se ressaltar que, no entanto, o gentílico ‘varginense’ foi raramente utilizado em periódicos mineiros no período entre 1880 e 1883.

É provável que nessa época os autores ainda tivessem dúvida sobre qual forma de gentílico seria a mais adequada para se referir aos naturais ou habitantes da recém-criada cidade da Varginha.

O gentílico ‘varginense’, no entanto, aparece em publicações bem posteriores, já do início do século XX. O Almanak Laemmert para 1911-1912 (p. 579 e 3236) cita a Sociedade Algodoeira Varginense e o Grêmio Recreativo Varginense.

A ideia implícita na associação cognitiva dos autores em escolher o termo ‘varginense’ segue a sequência: vargem (varginha) / varginense. Sendo assim, para eles, o termo ‘varginense’ surge como uma derivação direta e mais explícita de ‘vargem’ e não do seu diminutivo ‘varginha’.

Outros gentílicos possíveis (não adotados) seriam vargiano, vargense, vargense-do-espírito-santo, varginense-do-espírito-santo ou varginhense-do-espírito-santo.

Nas questões da Língua que envolvem a criação de novos vocábulos, é o povo que faz do uso cotidiano a norma a ser adotada. De qualquer modo, o gentílico ‘varginhense’, tradicional e utilizado de longa data, prevaleceu sobre as demais possibilidades. A etimologia, segundo o Dicionário Houaiss (2001, p. 2830) é o topônimo Varginha + -ense.

O gentílico varginhense pode ser também utilizado de forma abreviada para ser referir aos naturais ou habitantes de São José da Varginha (MG), cuja forma completa é varginhense-de-são-josé, no entanto, em todo o território nacional a originalidade do termo e sua anterioridade estão relacionadas, sem dúvida alguma, à história de Varginha.

Quanto ao epônimo – nome atributivo ou alcunhado, Princesa do Sul, segundo relato oral de descendentes de Matheus Tavares da Silva, o primeiro presidente da Câmara Municipal de Varginha (atual cargo de prefeito), a alcunha Princesa do Sul surgiu quando a estrada de ferro passou por Varginha, em 1892, o que deu grande impulso ao seu desenvolvimento.

No início do século XX, Varginha era também conhecida como “A metrópole do sul de Minas” (O Sul-Mineiro, 1934).

3 POPULAÇÃO: ÍNDIOS, NEGROS, PORTUGUESES E IMIGRANTES

3.1 O povoamento de Varginha teve início na Vargem?

Outra questão relevante é que o povoamento de Varginha não teve origem na Vargem. De acordo com o senso comum de grande parte da população varginhense, o povoamento de Varginha teria tido início na Vargem, atual bairro da periferia da cidade. Há anos essa pretensa origem histórica do povoamento e urbanização de Varginha é aceita e reproduzida constantemente, inclusive em estabelecimentos escolares. Sobre essa questão o Almanach Sul-Mineiro (1884, p. 182) não deixa dúvida: “situada em uma formosa eminência, a cidade da Varginha deve seu nome a uma planície baixa que existe na distância de 2 quilômetros da povoação, e que, apesar de desabitada, deu o nome ao esperançoso lugar, que é hoje sede de um florescente município”. Embora o texto não nomeie, não há dúvida que a planície baixa a que se refere é o atual bairro da Vargem. Note bem que o autor afirma que o lugar era desabitado em período anterior a 1884, portanto, o povoamento e a urbanização da cidade não poderiam ter começado ali. Outros textos do mesmo período, inclusive publicações no Diário Oficial do Estado, fazem referência à Vargem. Na década seguinte à emancipação política de Varginha, segundo estudo da Corografia Mineira (MINAS GERAES, ed. nº. 348, 30 dez. 1897, p. 2), Varginha possuía dois povoados: “Salto e Vargem. O primeiro a 6 kilometros e o segundo a 2, da sede. O Salto tem 20 casas, sendo a sua população de 500 almas aproximadamente. A Vargem tem 13 casas e 200 habitantes. Não tem escolas, sendo seus habitantes atrasados”. A sede a que se refere o texto é o núcleo urbano principal do município de Varginha onde se localiza a Igreja Matriz do Divino Espírito Santo. O periódico Gazeta de Notícias, da Corte, se referia à Mutuca como Espírito Santo da Mutuca e ao povoado do Salto como Salto Grande da Mutuca (GAZETA DE NOTÍCIAS, ed. nº 171, 20 jun. 1890, p. 1). Em 14 de agosto de 1886, o periódico A Província de Minas se refere ao Salto como “distrito do Salto, termo da Varginha”. Ávila (1983, p. 3), pesquisador e autor do estudo Varginha: formação e evolução, afirma: “O caminho-tronco principal, à cuja margem surgiu nas alturas de 1785 a primeira capela e se construíram entre aquele ano e 1820 as seis primeiras casas de telhas, correspondia à estrada ou simples picada, ligando a Vila de Campanha ao então chamado Sertão de Três Pontas, e é de se supor que cortasse em diagonal o atual perímetro central da cidade. O referido aglomerado de primeiras habitações se formou em local próximo ao em que se abriria, bem mais tarde, a Avenida Rio Branco”.

A crença popular que Varginha teve origem na Vargem parece ter-se estabelecido pela similaridade fonética e de sentidos na denominação dos topônimos Vargem / Varginha, uma vez que ‘varginha’ é o diminutivo de ‘vargem’. O raciocínio é o seguinte: se a cidade se chama Varginha e se havia – e há atualmente, um lugar na periferia da região Nordeste denominado Vargem é porque a cidade teve lá o início de seu povoamento.

Esse equívoco pode ter sido endossado por uma também equivocada interpretação do texto de Álvares Rubião (1919), autor do Álbum da Varginha. Diz ele: “o estranho vocábulo de Varginha, traz sua origem no populoso bairro da “Vargem”, situado a um quilômetro a N.E. da atual cidade”. Percebe-se, claramente, que Rubião não afirma que Varginha teve o início de seu povoamento na Vargem. Ele apenas diz que o vocábulo ‘varginha’ teve origem em ‘vargem’ uma vez que ‘varginha’ é um diminutivo da palavra ‘vargem’.

O falso raciocínio simplista que situa a origem de Varginha na Vargem não encontra, portanto, nenhum respaldo na documentação do final do século XVIII e do século XIX, a mais remota que, atualmente, se encontra sobre a cidade. O texto do Arquivo Público Mineiro supracitado ainda afirma que o núcleo urbano principal da cidade, ou seja, a sede “Tem 300 casas (…), formando 13 ruas e 6 praças (…) Estima-se em 12.000 a população do distrito [núcleo urbano principal; sede] e em 30.000 a do município zona urbana mais zona rural Não se conhece tradição sobre a origem da povoação, tendo esta sido começada em 1804, sob a invocação de Espírito Santo da Cotanduba [sic] [Catanduba]. Não há nenhum fato histórico digno de nota” (MINAS GERAES, ed. nº. 348, 30 dez. 1897, p. 2; REVISTA DO ARCHIVO PUBLICO MINEIRO, 1899, p. 616- 619). Os dados da Corografia Mineira sobre Varginha e os povoados de Salto e Vargem, divulgados em 1897, são os mesmos que constam das “Informações solicitadas a distintos cidadãos para a confecção de um trabalho sobre o Estado de Minas”, redigido onze anos após a emancipação da cidade.

Nossa hipótese é que o interesse dos antigos e dos atuais varginhenses pela vargem / planície representada pelo bairro da Vargem se deve à característica do relevo do município sendo o território 80% ondulado, 16% montanhoso e apenas 4% plano (IGA, 2013; VARGINHA – ÓRGÃO OFICIAL DO MUNICÍPIO, ed. nº. 938, 1º out. 2014, p. 5). As planícies do município, portanto, são áreas que dado a sua raridade no conjunto do relevo, chamavam muito a atenção do observador desde o início da ocupação do território pelo colonizador português.

Texto publicado na Gazeta de Notícias (Rio de Janeiro, 13 out. 1911), ilustra bem a perplexidade de muitos com a denominação Varginha para uma cidade cuja topografia é exatamente a oposta a uma vargem: “Esta cidade é um dos muitos lugares do Brasil que tem um nome bem ao avesso da sua topografia. Varginha, por quê? / Derramada no espinhaço dum espigão, com ladeira e declives a fazerem-lhe severa ronda, a cidade da Varginha melhor nome teria se fosse chamada “Serrinha”.

3.2 A formação populacional de Varginha

Até o século XIX, a população de Varginha, assim como a brasileira, foi formada, predominantemente, pela miscigenação de brancos europeus, indígenas autóctones e negros africanos. No município, a imigração de chineses, japoneses e coreanos, mais recente, ocorreu no século XX. A contribuição de indígenas e de negros foi fundamental para a formação populacional, para a economia e para a cultura de Varginha, mas até o momento tem sido relegada a segundo plano pela historiografia oficial, que privilegia, enaltece e glorifica os portugueses. Em relação aos imigrantes, os de origem europeia, principalmente o grupo hegemônico dos italianos, são mais valorizados que os de origem árabe.

Os indígenas tiveram influência econômica e cultural, que pode ser percebida na culinária, na arte e nas palavras incorporadas pelo português brasileiro, inclusive na denominação de topônimos: capivara, catapora, carioca, catupiri, Guanabara, mingau, tocaia etc. A influência mais marcante foi a dos Tupis, com o idioma tupi ou tupi antigo, da família linguística tupi-guarani, infelizmente, extinto.
O primeiro recenseamento populacional de Varginha foi realizado em 1832, assinado pelo Juiz de Paz Domingos Figueiredo de Carvalho, quando o povoado do Espírito Santo da Varginha era um distrito e curato da freguesia de Lavras, termo da vila de São João d’El Rey.
O procedimento de contagem agrupou a população em doze quarteirões, ocupados por 375 fogos (residências) e foram registrados os nomes, qualidades, condições, idade, estados e ocupações de cada habitante. Somente a população branca possui o registro do nome completo, com prenome e patronímico. Os escravos eram legalmente um bem dos seus senhores por isso, os pretos e pardos, não tinham sobrenomes, sendo referidos apenas pelos prenomes. Os forros não adquiriam patronímicos quando libertados.

As “qualidades” se referem à cor da pele: parda ou preta. Pardos são os mulatos. Quando a pessoa era branca, o espaço para anotar esse dado não é preenchido.

As “condições” registradas são apenas duas: cativo ou forro e, obviamente, estão atreladas às qualidades de pardo ou preto. Quando a pessoa tinha a pele branca, a linha do registro das “condições” não foi preenchida. Os “estados” se referem ao estado civil: solteiro, casado ou viúvo.

As crianças com idade inferior a quatro anos não foram incluídas no recenseamento. As idades variaram numa escala entre quatro e oitenta anos, todos lavradores. A categoria ocupações também incluiu os registros doente e mudo, para ambos os sexos.

Em suma, em 1832, Varginha possuía uma população geral de 1855 habitantes, dos quais 1300 (70%) eram livres e 555 (30%) cativos pretos ou pardos.

3.3 População geral e escrava 1872-1890

Em relação à população de Varginha, no Recenseamento do Brazil em 1872 – Imperio do Brazil, Varginha ainda fazia parte do município de Três Pontas e figurava como Freguesia do Divino Espírito Santo. A população geral era de 5.768 habitantes, sendo 2.934 homens e 2.834 mulheres (RECENSEAMENTO DO BRAZIL EM 1872, p. 115).

LIVRO Nº 2-B DE ESCRITURAS DO TRÁFICO DE ESCRAVOS DE VARGINHA 1884-1887. Acervo do Serviço Notarial Privativo “Braga” do 1º Ofício de Varginha.
LIVRO Nº 2-B DE ESCRITURAS DO TRÁFICO DE ESCRAVOS DE VARGINHA 1884-1887. Acervo do Serviço Notarial Privativo “Braga” do 1º Ofício de Varginha. Escritura pública de venda do escravo Sebastião, 19 anos de idade, crioulo, solteiro. Vendedor: Domingos José Pereira. Comprador: Joaquim Severino de Paiva. Valor da venda: Rs 600$000 (seiscentos mil-réis). Varginha, 15 de fevereiro de 1886.

À época da emancipação política, infelizmente, não foram produzidos dados censitários, pois o Censo de 1880 não foi realizado, tendo sido transferido para 1887, o que também não ocorreu. Por isso, os dados populacionais mais próximos de 1882 são os do Censo de 1890, o primeiro realizado pela República. Segundo o Censo de 1890, reproduzido na Revista do Arquivo Público Mineiro, a população do município de Varginha, composta pelo distrito de Varginha e pela Paróquia do Espírito Santo da Varginha, era de 10.432 habitantes, dos quais 5.305 eram homens e 5.127, mulheres. Os distritos de Carmo da Cachoeira e da Mutuca, com suas respectivas paróquias, eram parte do município de Varginha. A população total do município de Varginha, incluindo a desses distritos, era de 24.819 habitantes (ARCHIVO PUBLICO MINEIRO, REVISTA DO, 1898, p. 497). Conforme se constata, a população de Varginha teve um expressivo acréscimo no curto intervalo entre 1872 e 1890.

A Mutuca, atual Elói Mendes, era “o antigo distrito de Pontal da Varginha” (ANNUARIO DE MINAS, 1913, p. 183). Sobre o distrito da Mutuca consta registro com essa denominação pelo menos desde 1855 (A NOVA PROVINCIA, ed. nº. 36, 13 jan. 1855, p. 4). O Jornal A Capital afirma que Pontal é um “arraial insignificante do município de Varginha” (A CAPITAL, ed. nº. 2928, 2 abr. 1910, p. 1).

RETOUR AU VILLE D’UN PROPRIÉTAIRE. Ilustração de Jean-Baptiste Debret (1768-1848). Rio de Janeiro, 1822. Cotidiano do Brasil na primeira metade do século XIX. Escravos transportando o senhor branco em uma rede. Após a Abolição da Escravatura, em 13 de maio de 1888, os negros passaram a sofrer com a falta de um projeto nacional de inserção social, o que levou à continuação da desigualdade por falta de acesso à educação, qualificação profissional, renda e moradia
CAPATAZ PUNINDO ESCRAVO. Ilustração de Jean-Baptiste Debret. Overseers punishing slaves on a rural estate. (3 vols., Paris, 1834,1835, 1839), Voyage Pittoresque et historique au Bresil. Conrad, Robert. The Destruction of Brazilian Slavery 1850-1888. London, England: University of California Press, Ltd, 1972. Photography Obra do próprio, Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=57534432
ESCRAVO DO BRASIL. Altivez, dignidade e tristeza do negro escravo retratadas com maestria e sensibilidade artística por Theóphile Auguste Stahl, Fotógrafo da Casa Imperial Brasileira, c. 1865.
O menino Augusto Gomes Leal com a escrava Mônica, sua ama-de-leite. Fotografia de João Ferreira Villela, Recife – PE, c. 1860. Acervo da Fundação Joaquim Nabuco. Pernambuco. A relação entre escravos e senhores, muitas vezes, era permeada por afeto e o negro vivia como um agregado da família, conforme se percebe com clareza nessa fotografia, que revela o carinho do menino branco por sua ama-de-leite.

A população escrava de Varginha, no início de 1885, era de 619 pessoas, quantidade bem menor que a dos municípios vizinhos de Três Pontas (2.343) e Campanha (5.422). Dos 88 municípios mineiros que constam da lista do Fundo de Emancipação dos Escravos, publicada no periódico A Província de Minas, apenas São Gonçalo do Sapucaí possuía menos escravos que Varginha. Dentre eles, Leopoldina possuía o maior contingente de população escrava, com 15.764 pessoas e São Gonçalo do Sapucaí o menor, com 151 escravos (A PROVINCIA DE MINAS, ed. nº. 249, 26 fev. 1885, p. 2). Portanto, comparativamente aos demais municípios mineiros, Varginha possuía uma reduzida quantidade de escravos, logo após a sua emancipação política e às vésperas da Abolição. No ano seguinte – 1886, a população escrava de Varginha subiu para 743 (A PROVINCIA DE MINAS. Ano VII, edição nº. 380, p. 2. Ouro Preto, 18 ago. 1886).

3.4 O ideal abolicionista varginhense e a dramática realidade dos recém-libertos

Durante o século XIX, episódios envolvendo maus-tratos a escravos, e, posteriormente, à recém-libertos, eram frequentes. Em alguns desses episódios, os escravos praticavam a autoagressão ou agressão entre si; esses fatos raramente merecem a atenção de historiadores em seus estudos.
Em 1854, um caso trágico comoveu a Freguesia da Varginha. A preta Maria, hanseniana, “morreu queimada por se achar completamente embriagada: apareceu o cadáver de tal sorte, que ao tocar-se-lhe parecia bom couro torrado (…) a desgraçada preta, no último estado de embriaguez, se deixou queimar” (A NOVA PROVINCIA, ed. nº. 16, 25 ago. 1854, p. 4).

Em 1888, poucos meses antes da Abolição, segundo foi alegado, a escrava Emerenciana suicidou-se no Espírito Santo da Varginha, na fazenda de Antonio Gonçalves Braga. A notificação do fato foi encaminhada ao Ministério da Justiça (A UNIÃO, ed. nº. 141, 28 jan. 1888. p. 1).
Na segunda metade do século XIX, ganhou força em Varginha as ideias abolicionistas. Em 26 de setembro de 1886, Olympio Gonçalves de Araújo, escrivão da Coletoria Municipal de Varginha nomeado pelo Visconde de Paranaguá, proferiu, em Varginha, um discurso na audiência de libertação dos escravos com 60 anos do qual reproduzimos os trechos mais relevantes. O texto foi publicado originalmente na Gazeta Sul-Mineira:

(…) antigos e agarrados escravocratas, que pela sua maior parte condenavam em limine [sic] todo e qualquer sistema da liberdade e fraternidade, sistema este da democracia, que é o sistema republicano, sistema progressivo, porque a sua origem é liberdade, igualdade e fraternidade. (…) Senhores, por honra da humanidade já ninguém hoje pensa por tão acanhado molde d’aqueles antigos agarrados escravocratas. Pois os próprios conservadores atuais estão imensamente distanciados daqueles antigos, ao ponto de hoje reconhecerem e sustentarem a liberdade humana, como base de toda organização social. / Tal é o poderoso impulso que vai aparecendo, que a ação latente do tempo imprime ao progresso das idéias (A PROVÍNCIA DE MINAS, ed. nº. 391, 14 out. 1886, p. 4).

Em outros trechos do mesmo discurso, Araújo diz que os anos da escravidão são “tempos bárbaros” nos quais a “ordem e o progresso” são nulos. Ele alerta em tom profético sobre a queda da escravidão, que pouco tempo depois se concretizaria: “as suas muralhas sem base, sem fundamento, rolarão na corrente dos tempos”. Para ele o direito de propriedade na escravidão era “um suposto direito de propriedade do nosso semelhante” (A PROVÍNCIA DE MINAS, 14 out. 1886, p. 4).

No discurso de Araújo, percebe-se a sua formação iluminista, a influência dos ideais da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) e do Positivismo, cujo lema político “Ordem e progresso”, é a forma abreviada do lema religioso positivista elaborado pelo filósofo francês Auguste Comte, que pouco tempo depois se tornou o lema da bandeira republicana: “L’Amour pour principe, l’Ordre pour base, et le Progrès pour but” (COMTE, 2017).
A dura realidade varginhense da época, no entanto, entrava em choque com os ideais desse belo discurso de cunho humanitário e abolicionista. Havia rixas de toda ordem, inclusive entre os próprios pretos recém-libertados. No início de 1889, meses após a abolição, episódios violentos envolvendo pretos libertos no município eram de ocorrência comum. Um dos casos mais notáveis aconteceu na fazenda de Matheus Tavares da Silva e ganhou repercussão nacional ao ser publicado n’O Pharol, Diario do Commercio, do Rio de Janeiro, e no jornal A União, de Ouro Preto, com o título de “Assassinato na Varginha” A UNIÃO, ed. nº. 243, 26 jan. 1889, p. 2).

3.5 O legado cultural dos afrodescendentes

A contribuição da população negra para o desenvolvimento econômico e cultural de Varginha é imensa. Durante o século XIX até a Abolição da Escravatura, os negros constituíram a mão de obra para a lavoura, serviços domésticos e fábricas dos mais variados tipos de produtos, construção de edificações e de estradas. Dentre outras influências culturais, ressalta-se a dança, a culinária e as centenas de palavras incorporadas pelo idioma português brasileiro, que se expressam de A a Z: angu, batuque, berimbau, búzio, cachaça, cachimbo, cafuné, calombo, camundongo, dendê, dengo, inhame, jiló, lundu, marimbondo, moleque, quilombo, quitute, tutu, vatapá, zumbi etc. Duas palavras são especiais, pois além de terem origem africana, são uma síntese da história do Brasil e revelam a opressão sofrida e a superação do negro por meio da música: senzala e samba.

Em 1890, período da administração das Intendências, a população da sede e dos distritos de Varginha era a seguinte: Paróquia do Divino Espírito Santo da Varginha (sede): 10.432 hab., Paróquia de Nossa Senhora do Carmo da Cachoeira: 7.844 hab. e Paróquia do Espírito Santo do Pontal (distrito de Elói Mendes): 6.543 hab. Assim, a população geral do município era de 24.819 habitantes (ANNUARIO HISTORICO CHOROGRAPHICO DE MINAS GERAES (1909).

Segundo o Recenseamento de 1920, a população geral de Varginha era de 22.457 habitantes, dos quais 1.020 eram de estrangeiros. Os principais grupos de estrangeiros eram os italianos (3,6%), portugueses (0,5%), turco-asiáticos (0,2%) e espanhóis (0,1%). As porcentagens entre parênteses indicam a proporção de cada grupo de imigrantes na composição da população geral da cidade. Conforme se constata, os imigrantes italianos eram o grupo hegemônico. Eles representavam 79% dos estrangeiros em Varginha.

A miscigenação biológica entre portugueses, índios, negros e, posteriormente, imigrantes europeus e árabes das mais variadas procedências criou um amálgama multicultural responsável, hoje, pela identidade varginhense. Índios, negros e imigrantes foram agentes históricos que contribuíram para a formação sociocultural de Varginha. Nenhum desses grupos étnicos teve participação secundária nesse processo de construção. A miscigenação cultural revela sua força extraordinária ao se expressar em nossa vida cotidiana de um modo tão determinante e inconsciente que parece não existir.

4 ECONOMIA

A economia do Brasil, durante o Império, era predominantemente rural, da mesma forma que na província de Minas Gerais e no então distrito do Espírito Santo da Varginha. Primeira lavoura do Brasil Colônia, a cana-de-açúcar foi também cultivada em Varginha, muito antes do início da produção do café no município. Em 1874, Varginha possuía 35 engenhos de cana-de-açúcar, sendo dezoito movidos por água, quatorze por animais e três de serrar (VEIGA, 1874). Os engenhos de açúcar também produziam aguardente e rapadura.

Segundo o IBGE (1959), o comércio do recém-criado Curato do Espírito Santo (1806) começou a ser feito entre o povoado de Varginha e as vilas de Campanha da Princesa da Beira, Formosa de Formiga e os Portos da Corte e de Mangaratiba, por meio de tropas, único meio de transporte utilizado naquela época.

4.1 Comércio e serviços em 1832

Os dados apresentados pelo Censo de 1832 revelam que, em relação às ocupações, os homens trabalhavam nas funções ou cargos de administrador, alfaiate, caixeiro, camarada, carpinteiro, cultura, engenheiro, feitor, ferreiro, jornaleiro, lavrador, ofício de escrivão, ourives, negociante, negócio de venda, pedreiro, sapateiro, seleiro e vintenário. As mulheres trabalhavam como agência, costureira, fiadeira, tecedeira e rendeira (roçar, fiar e tecer), jornaleira, lavradora, oleira e vendeira.

No século XIX, agência indicava aquele que vivia de sua agência, ou seja, aquele que não possuía negócio fixo e vivia por sua própria conta. O termo é genérico e pode incluir várias ocupações como, por exemplo, lavar roupa, vender doces e quitutes, realizar pequenos negócios sem possuir estabelecimento próprio etc. Atualmente, o termo mais próximo de agência seria biscateiro. A ocupação caixeiro provavelmente se refere aos comerciantes, não necessariamente viajantes, já que o transporte era feito por meio de tropeiros. Camarada era o trabalhador que é empregado temporariamente numa propriedade rural para tarefa doméstica, agrícola, pecuária, de exploração mineral etc. Esse termo é utilizado ainda hoje em Varginha. Cultura é o cultivo da terra, principalmente nas plantações de cereais. Engenheiro significava, no Brasil, dono de engenho de açúcar ou de beneficiamento de mate. No caso de Varginha, tratava-se, com certeza, de um engenho de açúcar, uma vez que os memorialistas e documentos antigos não se referem a plantações de erva-mate no município. A ocupação jornaleiro é imprecisa pois não se referia a uma atividade desenvolvida, mas ao tipo de jornada de trabalho. Jornaleiro é aquele trabalhador a quem se paga jornal. O jornal é a remuneração salarial feita por dia de trabalho, portanto, jornaleiro é o trabalhador que trabalha e ganha por dia.

4.2 Atividade comercial no final do século XIX

Em 1874, uma década antes de Varginha se tornar município e cidade, o comércio já se apresentava desenvolvido. O município exportava para a corte fumo, toucinho, porcos e gado vacum e importava tecidos, ferragens, louças, sal e bebidas. O distrito contava com capitalistas (pessoas que emprestavam dinheiro a juros), negociantes de tecidos, armarinhos, ferragens, secos e molhados e açougues (VEIGA, 1874).

Resposta ao questionário enviado aos municípios mineiros, em 1893, fornece uma visão panorâmica da atividade agropecuária naquele ano: os cerrados prestavam-se à cultura da mandioca, e as demais terras, a toda sorte de cultura. Sendo terras altas e livres de geada, próprias para o plantio do café, cada alqueire custava, na época, Rs 300$000. As terras próprias para cereais, Rs 200$000 e as de campos e cerrados, entre Rs 100$000 e Rs 150$000. Os principais ramos da lavoura eram as de café, cana e fumo. Os instrumentos e processos usados no cultivo das terras eram primitivos. Não constavam projetos de melhoramentos agrícolas. Os gêneros não consumidos em Varginha eram exportados para o Rio de Janeiro e São Paulo. A média do salário dos trabalhadores agrícolas regulava entre Rs 2:000 réis e 3:000 réis, na ocasião das capinas, com sustento à custa do patrão. Havia criação de animais: muar, cavalar, vacum e suínos. O número de animais era pequeno e não tendia a aumentar. Em relação ao gado vacum, os melhoramentos se deveram à introdução do zebu. O gado vacum, lanígero ou suíno era exportado para o Rio de Janeiro. A maioria dos pastos era artificial. Em relação às fábricas e indústrias do município, a Resposta ao questionário enviado aos municípios mineiros em 1893, cita uma fábrica de vinho produzido com a uva Isabel, para consumo interno e uma fábrica de meias de lã (ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO).

4.3 Atividade comercial no início do século XX

Nas duas primeiras décadas do século XX, a pecuária em Varginha contava com a criação de gado vacum para corte e produção de leite, gado suíno, muares, ovelhas e cabras. A predominância era do gado vacum e suíno.

Segundo Rubião (1919), “O comércio de Varginha pode ser considerado o mais importante de todo o Sul de Minas, pois importantes casas atacadistas servem as praças de Elói Mendes, Três Pontas, Dores de Boa Esperança, Campos Gerais, Paraguaçu, Carmo da Cachoeira e Vila Nepomuceno”.
Sobre a atividade industrial em Varginha, diz Capri (1918): “Entre os principais estabelecimentos industriais, destacam-se os destinados ao beneficiamento do café, todos localizados em proximidade da estação férrea de Varginha6.”

Fonseca & Liberal (1920), citam à prestação de serviços e outras indústrias varginhenses: aguardente, rapadura, manteiga, fábricas de gelo, balas e caramelos, bebidas, banha, mosaicos e cerâmica, oficinas mecânicas, serrarias e carpintarias (movidas à eletricidade, o que indicava o progresso e modernidade da época), torrefações de café, curtumes de couros, máquinas de aluguel de beneficiar arroz e café, ferreiros e padarias.
Em 1920, Varginha contava com uma agência do Banco do Brasil e do Banco Hipotecário e Agrícola do Estado de Minas Gerais.

4.4 Café

Em relação à cafeicultura em Varginha, vários autores da primeira metade do século XX abordaram o assunto e todos consideraram o café a principal riqueza do município.

Segundo Lefort (1950), a cultura do café foi introduzida em Varginha na década de 1870, na fazenda do Campestre, pelo agricultor Antônio Teixeira de Resende.

Segundo Rubião (1919), foi por volta de 1885, que começaram a despontar os primeiros cafezais nas colinas e morros do município de Varginha, cultura que garantiria a grandeza e prosperidade do município nas décadas seguintes. Entretanto, o autor ressalta que antes desta data, diversas plantações da preciosa rubiácea tinham sido tentadas no município, com resultado negativo. Rubião ainda afirma que a primeira máquina de beneficiar café no município foi inaugurada em 1893, na fazenda Pouso Alegre, propriedade do coronel João Urbano de Figueiredo e que esse exemplo foi seguido por muitos outros fazendeiros e particulares. Assim, em 1919, o município possuía mais de trinta máquinas de café e Varginha ocupava o terceiro lugar no estado como município exportador de café. O autor afirma que o café era a lavoura predominante e nem poderia ser de outro modo, pois o município produzia o melhor café do Brasil, não somente pelo seu especial aroma, mas também pela homogeneidade do grão e seu colorido.

Capri (1918) considerava que o café constituía a principal fonte de riqueza do município, cujas terras férteis poderiam ser utilizadas para o cultivo de vários tipos de lavouras. O município de Varginha era o Eldorado do Café do Sul de Minas, sendo o café produzido de “excelente qualidade que igual não se encontra em parte nenhuma”. Depois dos municípios de São Paulo do Muriaé e Carangola da Zona da Mata, Varginha é o município do Estado de Minas que mais café exporta, com a diferença que por sua qualidade, o Café “Varginha” é reputado único e excepcional”.

Fonseca; Liberal (1920), afirmam que o café de Varginha possuía excelente qualidade, superior a todo o congênere do Brasil, “café especialmente encomendado pelos mercados consumidores do velho continente, ante a sua qualidade superlativa e seu aprimorado beneficiamento, chegando ao requinte de alguns importadores de Gênova exigir café de Varginha e da Fazenda tal, como acontece com o café tipo Emílio, da propriedade agrícola do Cel. Emilio de Rezende”.

Segundo os autores, o município de Varginha produzia quinhentas mil arrobas de café. Rubião apresenta o mesmo dado e acrescenta que “reunida com as parcelas que acodem a esta praça dos municípios vizinhos, alcança a elevada cifra de oitocentas mil arrobas”.

As propagandas impressas em jornais locais da época anunciavam máquinas de beneficiar café.

A I Guerra Mundial afetou a produção e o comércio do café produzido em Varginha para a Europa. É Rubião (1919, p. 37) que diz: “(…) repentina alta do preço do café que, com a conclusão do armistício entre os beligerantes, achou-se livre da corrente que, durante quatro longos anos, tão obstinadamente o prendeu nos armazéns dos nossos portos paralisados e congestionados.” Os quatro longos anos a que se refere o autor, é o período de duração da Guerra: de 1914 a 1918.

5 FONTES DOCUMENTAIS 1882-1920

Entre 1882, ano da emancipação político-administrativa de Varginha, e 1920, duas fontes documentais sobre a história do município se destacam: as atas da Câmara Municipal, registradas em livros específicos e os álbuns ilustrados de propaganda sobre o município.

5.1 Atas da Câmara Municipal 1882-1920

As principais fontes documentais oficiais primárias de pesquisa sobre a história de Varginha, desde a emancipação político-administrativa do município, em 1882, são os livros de atas da Câmara Municipal, do Conselho de Intendência e do Conselho Distrital.

Até o momento, todas as atas do período entre 1882 e 1920 foram transcritas e publicadas em livros editados pela Prefeitura por meio da Fundação Cultural do Município. Os títulos dos livros são:

Atas da Câmara Municipal de Varginha (MG) no Brasil Império 1882-1889;
Varginha (MG) na República da Espada: atas do Conselho de Intendência (1890-1892) e do Conselho Distrital (1893-1894);
Varginha (MG) na República Oligárquica: atas da Câmara Municipal 1910-1915;
Varginha (MG) na República Oligárquica: atas da Câmara Municipal 1915-1916; e
– Varginha (MG) na República Oligárquica: atas da Câmara Municipal 1916-1920.

A transcrição, realizada com atualização ortográfica e com notas explicativas, permite que os textos sejam compreendidos por um público amplo, inclusive alunos do ensino fundamental e médio.

5.2 Os álbuns ilustrados de propaganda sobre Varginha 1918-1920

Na moda em Minas Gerais, na segunda década do século XX, os álbuns ilustrados de propaganda dos municípios faziam sucesso. Eles apresentavam grande variedade de informações mesclando principalmente dados estatísticos e informações sobre história, geografia, economia, sociedade, política, religião, arquitetura e urbanismo, cultura, arte e desportos.

Os álbuns sobre Varginha foram impressos em papel de boa qualidade com cuidadosa diagramação. Além do texto, os álbuns apresentam centenas de fotografias, constituindo, por isso, um relevante documento iconográfico.

No período entre 1918 e 1919, foram publicados três álbuns publicitários fotográficos sobre Varginha:

Álbum de Varginha, de Sylvestre Fonseca e João Liberal, de 1920, com 159 páginas, publicado pela Pocai & C., de São Paulo, ilustrado com mais de uma centena de fotografias. Esse álbum foi finalizado em outubro de 1918, durante a epidemia da gripe espanhola.
Um dos autores / organizadores, João Liberal (1891-1949), jornalista e poeta varginhense, autor de Sombras Femininas, foi redator-chefe e proprietário do jornal O Momento fundado em primeiro de maio de 1915, editado e publicado em Varginha. Embora essa informação não conste do Álbum de Varginha, os textos são de autoria de João Liberal e, a maioria das fotografias, de Sylvestre Fonseca.
Álbum da Varginha, de Luiz José Álvares Rubião, sem data da impressão (1919?), com 154 páginas, publicado pela Casa Maltese, estabelecimento gráfico varginhense de propriedade do imigrante italiano Gaspare Maltese. O álbum é ilustrado com 178 fotografias. Álvares Rubião era agrimensor e escritor, autor dos livros A pesca no estado de Minas (1912) e o Leão do Mar (1946).
Varginha, de Roberto Capri, publicista-editor, de [1917? 1918?], com 28 páginas. O álbum, publicado pela Pocai & Cia, é ilustrado com quarenta fotografias. As gravuras foram executadas nas oficinas do jornal O Estado de S. Paulo. A página 20 é dedicada a Elói Mendes, antigo distrito de Varginha, emancipado em 1911.

6 VARGINHA POLO REGIONAL: A BELLE ÉPOQUE VARGINHENSE E OS PROPULSORES DO DESENVOLVIMENTO 1881-1913

Denominamos belle époque varginhense, o período de 32 anos compreendido entre 1881 e 1913, marcado por fatos que tiveram profundo impacto social e econômico: a criação do município (1881) e da cidade (1882); a abolição da escravatura (1888); a elevação a sede de comarca (1890); a inauguração da estrada de ferro (1892) e a imigração italiana (final do século XIX e início do século XX). A soma desses fatores contribuiu para Varginha tornar-se um centro de expressão regional. Podemos denominá-los propulsores de desenvolvimento, pois determinaram o progresso alcançado pela cidade no decorrer do século XX.

Estação Ferroviária de Varginha. Chegada do trem misto das 11 horas. Fotografia: Garcia. In: FONSECA, Sylvestre; LIBERAL, João. Álbum de Varginha. São Paulo : Pocai & Cia, 1920, p. 41.

O ano de 1914, com a eclosão da I Guerra Mundial, marca de forma abrupta e trágica, o final da belle époque varginhense e a entrada no período da maior e mais profunda crise social, econômica, política e sanitária vivida pelos cidadãos varginhenses. Num curto tempo a cidade foi empurrada do paraíso ao inferno, com a eclosão da I Guerra Mundial, que provocou profundo impacto na vida econômica do município, predominantemente dependente da exportação do café para Europa. Houve escassez de alimentos, uma crise política local dividiu a cidade em dois partidos políticos e a epidemia da gripe espanhola fez, no mínimo, 184 vítimas fatais.
Na última década do século XIX, a construção da via férrea por Varginha contribuiu enormemente para o desenvolvimento da cidade e da região. A notícia da inauguração, no entanto, recebeu apenas uma pequena nota, sem título, na coluna Várias Notícias, do Diário Oficial Minas Gerais, em 30 de maio de 1892: “Foi inaugurada a Estação da Varginha, da Companhia Muzambinho”. A partir da inauguração da ferrovia e com a expansão da cafeicultura para exportação para a Europa, Varginha teve um grande incremento econômico e, com isso, atraiu sede de representações de órgãos estaduais e federais, o que contribuiu para que, em curto tempo, o município se tornasse um centro regional de relevância.
No início do século XX, o grande marco do progresso científico e tecnológico da época, na cidade, foi, sem dúvida, a inauguração da energia e da luz elétrica, no dia 12 de abril de 1914, durante sessão especial da Câmara Municipal realizada no Teatro Municipal, no mesmo local onde, atualmente, se encontra o Theatro Capitólio. A cerimônia oficial contou com as presenças de Wenceslau Braz, vice-presidente da República e Delfim Moreira, que seria eleito presidente do estado de Minas Gerais, em 07 de setembro daquele ano. A presença de ambos na cerimônia foi considerada tão relevante para a cidade que, no mesmo dia, foram alteradas duas denominações de logradouros públicos da região central: a Rua de São Pedro (antiga Rua da Chapada) passou a se chamar Rua Wenceslau Braz e a Rua Municipal (antiga Rua do Comércio), Rua Delfim Moreira.

7 DATAS DE IMPORTÂNCIA HISTÓRICA PARA VARGINHA 1763-1938

1763.  Referência à Ermida de Santo Antônio, Capela de Santo Antônio do Rio Verde (LEFORT, 1950, p. 17, 20 e 21). De acordo com Lefort, essa é a mais remota referência a um templo religioso de Varginha (LEFORT, 10º anuário da Diocese da Campanha, 1948).

1780.  7 de julho. Carta de sesmaria de Ponciano Ferreyra da Silva, no ribeirão do Tacho, barra do Rio Verde (ARQUIVO Público Mineiro. SC 206, p. 175) (apud VILELA, 2005).

1782.  junho. Carta de sesmaria de Antonio Craveiro na paragem do ribeirão do Tacho (ARQUIVO Público Mineiro. SC 234, p. 1).

1790-1793.  Segundo Lefort (1950, p. 17, 20 e 21), baseado nos registros de batizados em Campanha e Lavras, foi durante este período que algumas famílias provenientes dessas cidades, trazendo seus escravos, construíram residências na fazenda Santo Antônio do Bom Jardim do Rio Verde. O período marca, portanto, o início do povoamento de Varginha.

1793.  7 de setembro. Carta de sesmaria de João Ferreira Alves, na paragem da Pedra Negra (ARQUIVO Público Mineiro. SC 256, p. 197).

1795. Capela do Divino Espírito Santo das Catanduvas, referendada pelo decreto diocesano de 14 de julho de 1832 (LEFORT. 18º Anuário Eclesiástico da Diocese da Campanha, 1956, p. 56).

1796.  Fazenda dos Tachos. Fazenda do Bom Jardim, às margens do Rio Verde. Ambas pertenciam ao português José de Jesus Teixeira (LEFORT, 1950, p. 79-80).

1798.  27 de junho. Carta de sesmaria de José dos Santos Andrade, na paragem das cabeceiras do ribeirão do Tacho (ARQUIVO Público Mineiro. SC 285, p. 38).

 (?).  Poucos anos antes de 1806, o cel. Francisco Alves da Silva adquiriu o sítio que hoje é a região de Varginha (LEFORT, 1950). O autor cita a escritura do livro de Tombo da Paróquia (sem identificação do número do livro e das páginas).

1806.  12 de novembro. O coronel Francisco Alves da Silva e sua mulher D. Teresa Clara da Silva (é esse o nome que consta da escritura de 1806, de acordo com cópia feita em 1906; no inventário dela, de 1842, consta Thereza Clara Rosa da Silva) (CAMPANHA – MG, 1842) assinaram a escritura, vendendo por quatrocentos mil-réis o terreno exigido para a constituição do patrimônio distrital, com o objetivo de elevar o povoado à categoria de Curato. Nesse documento, Varginha é chamada de Espírito Santo (não consta Catanduvas nem Varginha). (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo, Livro do Tombo (não numerado) folha 3 verso, e 4 frente e verso, 27 nov. 1906, cópia a mando do vigário Pedro Nolasco de Assis).

____________________       3 de dezembro. Despacho da petição na cidade de Mariana, pelo doutor Quintiliano Alves Teixeira Jardim, provisor, vigário geral e juiz das Habilitações e Dispensas (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12).

_____________________ 4 de dezembro. Ordem para publicação do edital da doação patrimonial, que deveria ser afixado durante oito dias na porta da Igreja, em dia festivo, durante a estação da missa conventual (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12). Conventual é a missa que o pároco reza aos domingos e dias santos.

______________________ 12 de dezembro. Cumprimento do despacho do juiz das Habilitações e Dispensas, Quintiliano Alves Teixeira Jardim, pelo escrivão Antônio João Fernandes, às margens do córrego dos Pinheiros, dando posse judicial das terras ao procurador dos Povos Aplicados das Catandubas, o alferes Manoel Francisco de Oliveira (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 12). No livro Espírito Santo da Varginha (2003, p. 351), por erro de revisão consta que a posse das terras foi dada ao alferes Alves Ferreira. Corrigimos aqui o erro.

1807.  18 de janeiro. Criação do Curato do Espírito Santo das Catandubas pelo vigário de Santana de Lavras do Funil, padre José da Costa (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 13). De acordo com documentos citados por Lefort (1950), o nome completo do padre é José da Costa Oliveira.

1816.  26 de janeiro. Segundo Lefort (1950), pela primeira vez é utilizada a palavra Varginha em documento: o 3º Livro de Casamentos de Lavras, p. 10, que assenta o casamento do crioulo forro Adão José Rodrigues com Felizarda Maria. Lefort, no estudo “A diocese da Campanha”, de 1993 (p. 327-329), ou seja, 43 anos depois, manteve a afirmativa.

1826.  24 de junho. Nascimento de Joaquim Eloy Mendes, futuro Barão da Varginha, no Espírito Santo da Mutuca (atual Elói Mendes) (SALES, 2003, p. 132-133).

1831.  Segundo Lefort (1993, p. 327-329), em 1831, houve no Bispado de Mariana um movimento para a criação de algumas paróquias. O vigário de Lavras apresentou ao Tribunal e Mesa de Consciência a proposta da criação da paróquia de Varginha. O Tribunal se manifestou contrário à criação dessa paróquia.

_____________________ Lefort (1950) afirma que esse foi o ano provável da construção das obras da futura Igreja Matriz. De acordo com Matzner (1950?, p. 10 e 14), a primeira Igreja Matriz ficou concluída neste ano.

________________________ Inauguração da ponte sobre o Rio Verde, no Porto dos Farinhas (RUBIÃO, 1919). Obra fundamental para ligar Varginha a Campanha.

1840. 25 de novembro. Falecimento de D. Tereza Clara Rosa da Silva, aos 52 anos de idade. Ela era esposa do capitão Francisco Alves da Silva, casal que vendeu ao procurador dos povos aplicados o sítio para a constituição do patrimônio da igreja matriz (CAMPANHA – MG. Centro de Memória Cultural do Sul de Minas – CEMEC-SM. Inventário de Thereza Clara Rosa da Silva. Documento nº 13, caixa nº 13. 1º fev. 1842).

1841. Pelo que se deduz dos dados encontrados, é esse o ano provável do nascimento de Matheus Tavares da Silva, primeiro prefeito de Varginha (presidente da Câmara). O registro de óbito do Cartório do Registro Civil de Varginha (Livro C-4, fl. 199), atesta que ele faleceu de embolia cerebral, em 28 de setembro de 1906, aos 65 anos de idade. O atestado foi assinado pelo médico José Frota. O assentamento de óbito da Paróquia do Divino Espírito confirma a data de falecimento e a idade do falecido (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro de Óbitos n.º 6, 1905-1907, registro nº 16, fl. 33vº).

1845. Construção da capela do Rosário pela Irmandade do Rosário constituída pelos escravos. A capela estava localizada na avenida Rio Branco em frente ao atual número 304, área onde está um jardim. Na época, o local passou a ser chamado de Largo do Rosário.

1850.  2 de maio. A Lei Provincial n.º 769, eleva à categoria de paróquia o Curato de Espírito Santo da Mutuca (atual Elói Mendes), que desmembrado de Varginha, é incorporado ao município de Campanha.

___________________ 1º de junho. A Lei Provincial n.º 471, eleva o Curato do Espírito Santo da Varginha à categoria de paróquia (freguesia), anexada ao município de Três Pontas. Com isso, a Igreja do Divino Espírito Santo foi elevada à categoria de Matriz (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro do Tombo IV, fl. 74f.), durante o paroquiato do padre Manoel Furtado de Souza.

1872.  A seca flagelou Varginha.

1873. Construção da capela de São Sebastião no mesmo local onde existe a mesma igreja até hoje, reformada e ampliada.

1875.  agosto. Acontece a revolta popular provocada pelo alistamento militar que ficou conhecida pelo nome de “rasga-listas”. Houve tumulto e violência em Varginha (ARQUIVO Público Mineiro. Annuario Historico Chorographico de Minas Geraes. Governo Civil e ecclesiastico. 1909).

1881.  22 de setembro. A Lei Provincial n.º 2785, criou e incorporou o município do Espírito Santo da Varginha à comarca de Três Pontas e elevou a freguesia  à categoria de vila: a Vila do Espírito Santo da Varginha.

 ____________________ 17 de dezembro. Sessão de instalação do município.

 ____________________ 29 de dezembro. Criação do foro civil.

1882.  7 de outubro. A Lei Provincial n.º 2950, eleva a Vila do Espírito Santo da Varginha aos foros de cidade: a cidade do Espírito Santo da Varginha.

______________________ 17 de dezembro. Primeira reunião da Câmara Municipal.

1883.  21 de maio. Primeira qualificação de jurados do município (CAPRI, 1916).

________________________ 21 de novembro. Primeira reunião do Júri (CAPRI, 1916).

1887 ___________________ Chegada ao município das primeiras famílias de imigrantes italianos. Eles substituíram a mão de obra escrava nas fazendas de café e estabeleceram-se na cidade, assumindo atividades de comércio e serviços mecânicos.

1888. 13 de maio. Abolição da Escravatura.   

27 de junho. Decreto assinado pela princesa Isabel concedeu o título de Barão da Varginha a Joaquim Eloy Mendes (1826-1913) O título consta do Arquivo Nobiliárquico Brasileiro, dos barões de Vasconcelos (1917, p. 528) (SALES, 2003, p. 132-133).

1889.  15 de novembro. Proclamação da República. A partir desse ano os registros de nascimentos, casamentos e óbitos passaram a ser sistematicamente feitos no Cartório Civil. Antes desta data, eram feitos nas Paróquias (SALES, 2003).

_________________________ Demolição da antiga Igreja Matriz do Divino Espírito Santo. No livro Espírito Santo da Varginha 1763-1920 (Sales, 2003, p. 353) devido a erro de digitação, consta que a antiga igreja foi demolida no ano de 1899. Lefort não deixou dúvidas quanto à data correta: “No dito ano de 1889, quando no Brasil se processava o movimento pró-República, também Varginha deitava por terra seu velho templo” (LEFORT, 1950).

1890-1894 Varginha na República da Espada: período da administração municipal por meio do Conselho de Intendência (1890-1892) e do Conselho Distrital (1893-1894), uma vez que as Câmaras Municipais, da época do Império, foram dissolvidas após a Proclamação da República.

1890.  2 de abril. Criação do termo e da Comarca de Varginha (CARVALHO, 1922).  Segundo Fonseca; Liberal (1920, p. 18), a comarca foi criada em 20 de maio de 1890 (dado incorreto). De acordo com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a Comarca de Varginha foi instalada em 25 de março de 1892.

____________________ 22 de setembro. O decreto n.º 194, reincorporou Elói Mendes ao município de Varginha, agora com o nome de Espírito Santo do Pontal, permanecendo como distrito durante 21 anos.

1892.  25 de março. Instalação da Comarca de Varginha (Tribunal de Justiça de Minas Gerais).

______________________ 28 de maio. Inauguração da Estação de Varginha da Estrada de Ferro Muzambinho (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 18). A notícia foi dada sem nenhuma relevância com apenas uma frase, no Diário Oficial Minas Gerais, do dia 30 de maio: “Foi inaugurada a Estação da Varginha, da Companhia Muzambinho” (SALES, 2003, p. 180).

_________________________  Entra em circulação a Gazeta da Varginha, primeiro jornal da cidade (Gazeta da Varginha, ano 1, n. 48, p. 1, 31 dez. 1893). O atual Gazeta de Varginha é outro jornal, fundado em 07 set. 1965

1894. Ano em que começou a ser construída a terceira igreja matriz. Ela foi inaugurada em 1908; demorou, portanto, quatorze anos para ser concluída (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha – MG. Livro do Tombo (não numerado), fl. 7vº).

1895.  23 de maio. Falecimento de D. Marianna Bárbara da Conceição, a baronesa da Varginha, na casa-grande da Fazenda do Triunfo, na freguesia da Mutuca, atual município de Elói Mendes, na época um distrito de Varginha. Ela era filha de Mariano José de Farias e de D. Francisca Maria do Nascimento e natural da Província do Rio de Janeiro. Era casada com Joaquim Eloy Mendes (1826-1913), barão da Varginha. O Livro de Óbitos nº 1 (1879-1907), do Cartório do Registro Civil de Elói Mendes (MG), do qual constava o óbito da baronesa da Varginha encontra-se perdido (SALES, 2003, p. 134-138).

1896.  Fundação do Colégio Varginhense por D. Elisa Cândida da Fonseca. O colégio era apenas de meninas. Endereço: Rua do Carmo, 37 (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 61), atual rua Silva Bittencourt.

1900.  4 de agosto. Criação da Diocese de Pouso Alegre pelo Decreto Régio Latissime Potens (LEFORT, 1993, p. 8). A partir dessa data, a paróquia do Divino Espírito da Varginha passou a pertencer a essa Diocese. Anteriormente, pertencia à Diocese de Mariana (SALES, 2003, p. 353).

1901.  3 de maio. Fundação da Banda Santa Cruz pelo maestro Marciliano Braga (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 78).

1902.  Inauguração da iluminação pública a gás de acetileno (RUBIÃO, 1919).

1904.  6 de novembro. Inauguração da Casa de Caridade, posteriormente denominada Santa Casa de Misericórdia (RUBIÃO, 1919).

___________________  Inauguração do Theatro Municipal (RUBIÃO, 1919). Não confundir com o atual Theatro Municipal Capitólio, construído no mesmo local, após a demolição do antigo.

1906. 28 de setembro. Falecimento de Matheus Tavares da Silva (primeiro prefeito de Varginha), aos 65 anos de idade. Ele foi sepultado no Cemitério Paroquial (atual Praça da Fonte) (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro de Óbitos n.º 6, 1905-1907, registro nº 16, fl. 33vº). A causa da morte foi embolia pulmonar, segundo o atestado de óbito do médico José Frota (VARGINHA. Cartório do Registro Civil. Livro de Óbitos C-4, fl. 199). Posteriormente, seus restos mortais foram trasladados para o atual Cemitério Municipal.

_____________________ 27 de novembro. Um século depois, o vigário Pedro Nolasco de Assis manda copiar a escritura do patrimônio da Igreja Matriz cujo documento é datado de 12 de novembro de 1806, no Livro de Tombo da Paróquia do Divino Espírito Santo (folhas 3 verso, e 4 frente e verso).

1907.  17 de junho. O padre Pedro Nolasco de Assis, vigário da Paróquia do Divino Espírito Santo da Varginha, redige o documento “Inventário das capelas e cemitério”, um dos mais completos documentos sobre as capelas de Varginha. O documento apresenta uma detalhada lista de todas as capelas da zona urbana com suas dimensões e alfaias (Paróquia do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro de Tombo nº 1. Inventário das capelas e cemitério, fls. 6vº – 9vº).

___________________8 de setembro. Criação da Diocese da Campanha pelo Decreto Pontifício Spirituali fidelium do Papa São Pio X (LEFORT, 1993, p. 8). A partir dessa data, a paróquia do Divino Espírito Santo da Varginha passou a pertencer a essa Diocese. Anteriormente, pertencia à Diocese de Pouso Alegre (SALES, 2003, p. 354).

1908. 25 de abril. Publicação da Nunciatura Apostólica, em Petrópolis (RJ), cria a Diocese Campanhense, desmembrada da de Pouso Alegre. Com isso, a paróquia de Varginha e outras de vários municípios sul-mineiros passam a pertencer à circunscrição territorial da Sé Episcopal da Campanha. A Diocese da Campanha é sufragânea (está subordinada) à Arquidiocese de Pouso Alegre.

___________________7 de setembro. Inauguração da Igreja Matriz do Divino Espírito Santo. A Diocese da Campanha foi criada no ano anterior, mas o primeiro bispo, D. João de Almeida Ferrão, assumiu suas funções apenas em 1909. Por isso, a  bênção foi dada pelo  bispo de Pouso Alegre, D. João Batista Corrêa Nery (SALES, 2003, p. 354). Essa Igreja Matriz, a terceira a construída no mesmo local, esteve em atividade durante 65 anos e 8 meses, de 07/09/1908 a 05/05/1974, quando foi celebrada a última missa (REVISTA DIVINO E ROSÁRIO, 2006, p. 16).

1911.  30 de agosto. Emancipação político-administrativa do distrito de Espírito Santo do Pontal (atual Elói Mendes), elevado à categoria de cidade pela Lei n.º 556, nessa data.

1913.  agosto. Inauguração da “Empresa Telephonica Varginhense”, com mais de trezentos aparelhos instalados e linhas abrangendo duzentos quilômetros de extensão pelos municípios e distritos vizinhos (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 68), um grande feito tecnológico e das comunicações da época.

___________________ 28 de setembro. Falecimento, em Elói Mendes, de Joaquim Eloy Mendes, o Barão da Varginha, com 87 anos de idade (SALES, 2003, p. 132-133).

1914.  12 de abril. Lançamento da pedra fundamental do atual Colégio Marista. Inauguração da iluminação elétrica no Theatro Municipal, em cerimônia iniciada às dezoito horas. Estiveram presentes nas duas cerimônias, o vice-presidente da república Wenceslau Braz e o presidente eleito do Estado de Minas Gerais (atual função de governador) Delfim Moreira. Ata da Câmara Municipal revela que Wenceslau Braz apertou o “botão elétrico”, acendendo as luzes. Nesse dia, a Rua de São Pedro teve seu nome trocado para Rua Wenceslau Braz e a Rua Municipal (antiga Rua do Comércio) para Rua Delfim Moreira.

______________________ Início das obras do Mercado Municipal.

1915.  1.º de maio. Fundação do jornal O Momento, diretor João Liberal (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 31).

______________________ 3 de outubro. Fundação da equipe de futebol Varginha Sport Club, por membros da elite local (FONSECA; LIBERAL, 1920, p. 62).

_______________________ 24 de outubro. Benção da capela do Rosário, a segunda construída em Varginha, situada no alto do Cruzeiro, pelo vigário padre Leônidas João Ferreira. A capela se localizava onde atualmente é o VTC – Varginha Tênis Clube (PARÓQUIA do Divino Espírito Santo da Varginha. Livro de Tombo nº 1, fl. 43vº-44f.).

1918.  6 de março. Criação do Cemitério Municipal pela Lei n.º 345.

_______________________ 6 de abril. Interdição do cemitério paroquial da Praça Barão do Rio Branco, atual Praça da Fonte, pela Lei n.º 351.

_______________________ 18 de outubro. Falece José, de dois anos de idade, a primeira vítima fatal da gripe espanhola em Varginha. Ele era filho de José Malaquias de Lima e de Maria Cândida de Jesus (SALES, 2004; 2005).

__________________ 8 de novembro. O atual Cemitério Municipal foi aberto para sepultamentos. A inauguração seria no dia 15, para coincidir com a data comemorativa da Proclamação da República, contudo, o grande número de óbitos devido à gripe espanhola antecipou a abertura em uma semana (SALES, 2003, 2004 e 2005).

1919.  21 de janeiro. Falecimento de Geralda, de seis meses de idade, última vítima fatal da gripe espanhola em Varginha. Ela era filha de Feliciano Fidélis (não consta o nome da mãe). A gripe espanhola levou a óbito 184 pessoas em Varginha, sendo que pelo menos 155 delas eram varginhenses natos (SALES, 2004; 2006).

_____________________ 11 de setembro. Inauguração da ponte entre Varginha e Elói Mendes, no Porto dos Buenos.

1922.  4 de novembro. A Câmara Municipal de Varginha adquiriu da Fábrica Geral dos Patrimônios da Diocese da Campanha o vasto terreno da região central de Varginha (VARGINHA, 1922). A área foi comprada e doada pelos próprios moradores, em 1806, para o Bispado de Mariana para constituir o patrimônio da capela com o objetivo de elevar o povoado à categoria de curato. A Igreja, portanto, vendeu para os varginhenses a terra que havia ganhado deles.

1938. 17 de dezembro. Emancipação político-administrativa do distrito de Carmo da Cachoeira (Decreto-Lei nº 148).

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